sábado, 7 de julho de 2007

Equilíbrio interior


A noite e o dia. A vida e a morte. O desejo e o medo. O lodo e o lótus. Dentro e fora. Na aparência, são fenômenos e estados contrários e separados. Mas na realidade formam uma unidade. Um não existe sem o outro. Estão intimamente ligados e se alternam num movimento pendular, como para mostrar a efemeridade de tudo que nos cerca. Nada é estático; nada é só preto ou branco; nada é permanente. A inconstância e transitoriedade das coisas chamam o espírito humano à necessidade de compreender a dança dos opostos e de conviver com eles.

Dividimos o dia em manhã, tarde e noite; dividimos as estações em verão, outono, inverno e primavera. Vemos tudo dividido.

Dividimos nossos humores em diferentes emoções. Ora estamos tristes, ora alegres ou raivosos, deprimidos, esperançosos...Dividimos fora e dividimos dentro. Vivemos divididos.

Onde estamos nós, dentro de nós? O que em nós é constante? Há algo em nosso interior menos instável que nosso eu ora temeroso, ora repleto de desejos? Existe em nós um lugar no qual possamos nos proteger das perdas inevitáveis que nos esperam?

Alguns seres, cujas biografias são exemplos de equilíbrio, afirmam que sim. Fossem as situações externas favoráveis ou tempestuosas, mantinham sempre a mesma serenidade e conduta. Como sabiam que tanto o bem como o mal são passageiros, seguiam o caminho do meio, sem se apegar aos eventos externos, em busca do centro de onde tudo emana.

A chave para o equilíbrio é despertar para a necessidade de entregar-se a este centro interno, de onde se manifestam sabedoria e proteção. Ele é o berço do eu imperecível; o ponto de atração e repulsão de todas as coisas. É neste centro que habita o que chamamos de 'voz interior'.

Encontrar-se com o próprio centro é manter a vitalidade estável: daí provêm a força, as virtudes e o amor profundo. É também a partir do distanciamento deste centro que se manifestam os extremos ('ex-cêntrico'/fora do centro), que conduzem ao desequilíbrio, à dor e à perda da ligação com o eu real.

Viver sem contato com este centro é como passear no campo e ver as formas que compõem a Natureza -como pássaros, árvores e bichos- dissociadas, sem vínculo entre si. Mas viver em união estreita com o próprio centro é semelhante a passear neste mesmo campo e, diante da água, dos pássaros, do zumbido dos insetos e da presença das montanhas, contemplar um quadro único e harmonioso, simultaneamente em repouso e movimento. É compreender que, como num corpo perfeito, cada elemento corresponde a um órgão fundamental para o funcionamento de um todo único e indestrutível.

Livros recomendados

Autoconhecimento

"As quarenta questões sobre a alma" - Jacob Boehme, Polar Editorial
"Autobiografia de um yogue" - Paramahansa Yogananda, Omnisciência

Romances

"O Fio da Navalha", de W. Somerset Maugham
Sidarta, de Hermann Hesse (clique no título para baixar o livro em arquivo pdf, em espanhol)

Filmes

"O Fio da Navalha", de Edmund Goulding, com Tyrone Power e Gene Tierney (disponível em DVD, em Clássicos)
"Dança com Lobos", de Kevin Costner, com Kevin Costner (disponível em DVD)

Vídeos relacionados

Lorenna Mackinett – Mummers Dance

Enya – Caribbean Blue

Enya – Only Time

quinta-feira, 5 de julho de 2007

As manipulações da mídia – continuação


Nunca foi intenção deste blog exercer a função de ombudsman da mídia, denunciando manipulações, desmandos, omissões e –por que não dizer?- falcatruas. Se este fosse o objetivo, o espaço teria que se dedicar exclusivamente a essa finalidade, o que não é, nem jamais foi a proposta do blog Liberdade de Expressão e Cultura.

No entanto, o post “As manipulações da mídia” gerou controvérsias, ataques vindos de/e em outros espaços, inclusive, um na própria área de administração do blog, feito por um “hacker”, que inutilizou a ferramenta por um dia –situação já contornada. Até de apologia ao terrorismo o texto foi acusado, sendo que seu mote é simples: a grande imprensa manipulou a tentativa de atentado terrorista na Inglaterra, aumentou suas proporções e alcance, procurando acuar ainda mais os muçulmanos não só naquele país, mas em todo o mundo. O post anterior mostrou como isso tem acontecido sempre que a oportunidade se apresenta, com informações e dados comparativos, de maneira objetiva. É isso que esta continuação pretende fazer, selecionando mais algumas passagens que demonstram como, para certo tipo de imprensa, o importante é manipular fatos, ora pela omissão, distorção ou mentira.

Ataque terrorista no Iêmen

Na segunda-feira passada, dia 2 de julho de 2007, um atentado terrorista no Iêmen matou 10 pessoas: sete turistas espanhóis e três iemenitas (um dos quais o próprio homem-bomba). O fato recebeu míseras linhas da imprensa ocidental, na terça-feira, ao contrário do atentado que não houve na Inglaterra. Possivelmente pelo Iêmen ser um “país periférico”, pouco digno das agências de notícias internacionais e de seu potencial para causar histeria coletiva. Mesmo com a morte de sete espanhóis.

Na quarta-feira, dia 4 de julho, ocorreu um protesto no Iêmen com grande parte da população e dirigentes daquele país, clamando em alto e bom som: “Não ao terrorismo! Não à Al Qaida!” Aconteceu o que determinados setores da imprensa de todo o mundo acusam os muçulmanos, inclusive os moderados e civis comuns, de não fazerem: uma gigantesca manifestação pública contra o terror. Que passou praticamente em branco na imprensa.

Nenhum dos quatro grandes jornais brasileiros citou o ocorrido, preferindo ater-se exclusivamente à tentativa de atentado na Inglaterra. Dentre os jornais internacionais, só o espanhol “El País” deu em sua primeira página fotos da passeata de protesto ao terrorismo no Iêmen, que terminou diante da embaixada da Espanha, para prestar condolências às vítimas do atentado. A matéria (que pode ser lida clicando-se sobre o título em espanhol) é "Miles de yemeníes se solidarizan con la víctimas del atentado" (Milhares de iemenitas se solidarizam com as vítimas do atentado).

O mesmo “El País”, numa verdadeira demonstração de civilidade e para ajudar a impedir que o preconceito se espalhasse contra o Iêmen, publicou, na mesma edição, a bela crônica ‘O Outro Iêmen’ (clique sobre o título para ler no original, em espanhol).

Burca ou lenço?

Ignorância ou má fé? Fica a dúvida ao ler o texto Clérigo rebelde foge com burca, no “Globo Online”. A matéria fala de um clérigo islâmico preso no Paquistão ao tentar fugir do país usando uma burca –que, vê-se pela foto, não é burca, mas 'hijab'. Possivelmente, o erro vem da agência de notícias, que confunde 'hijab' (lenço ou véu) com burca, indumentária de origem afegã, que cobre o corpo inteiro da mulher, não deixando qualquer parte à mostra. Engano ou não, trata-se de mais uma propagação de um equívoco, que apresenta esse adereço como se fosse islâmico. Não é: a burca surgiu no começo do século 20, durante o regime de Habibulla (1901-1919), que a criou para ocultar as mulheres de seu harém. Na década de 50, tornou-se popular no Afeganistão, pois passou a ser copiada das classes altas como símbolo de status social.

Burca, extirpação do clitóris feminino, morte por apedrejamento são corriqueiramente mostrados pela mídia como costumes inerentes ao Islã. Não são. São costumes tribais ou de países onde há muçulmanos, mas não fazem parte da tradição islâmica. O mesmo ocorre com o suicídio, que é condenado no Alcorão (supremo livro do islamismo e principal base para o Direito Islâmico). Adianta alguma coisa dizer que o suicídio não tem base islâmica? Muito pouco. Com raras exceções, a mídia não tem o menor interesse em conhecer o que não entende. Alhos tornam-se bugalhos e dessa maneira forma-se uma imagem pejorativa do islamismo mundo afora. Como há pouca gente em condições culturais de rebater e apontar os equívocos, as coisas ficam por isso mesmo e o erro se propaga.

Informação precisamente precisa

A redundância acima é proposital, para mostrar que não há acasos no que este blog publica. No post anterior, um dos parágrafos no tópico “Pequena lista de mentiras, distorções e omissões da mídia” menciona que um dos quatro maiores jornais do país, em sua versão online, não deu a mesma informação em igualdade de condições para os envolvidos, quando do aniversário dos 40 anos da Guerra dos Seis Dias, entre Israel e árabes.

Uma pessoa amiga alertou este blog que o referido veículo de comunicação havia dado os dois lados. Ela só não percebeu que a visão israelense foi publicada no dia 2 de junho e a versão árabe só apareceu no dia 5 do mesmo mês. Três dias depois, quando o impacto da matéria já havia diminuído. Onde está a igualdade, portanto? Terá sido “ato falho”? Para aqueles que gostam de psicanálise freudiana, “ato falho” pode ser entendido como algo que o consciente não deseja, mas o inconsciente sim e que acontece, muitas vezes com conseqüências inesperadas. Nada que uma errata não pudesse ter resolvido. Contudo...

A visão israelense, no dia 2 de junho (clique sobre os links para abrir):

Link1

Link2

Link3

A versão árabe, no dia 5 de junho:

Link4


terça-feira, 3 de julho de 2007

As manipulações da mídia


A recente descoberta de carros-bomba em Londres, na Inglaterra, desencadeou no mundo ocidental mais uma avalanche de anti-islamismo e de manipulação de informações e conceitos por parte da mídia. Embora nada tenha acontecido de efetivo –exceto a descoberta de veículos carregados com material com potencial explosivo-, a imprensa ocidental transformou uma tentativa de atentado em atentado de fato.

Imediatamente na seqüência da descoberta destes veículos, no dia 30 de junho, um carro explodiu ao bater numa parede do aeroporto de Glasgow, sendo definido como “atentado terrorista” antes mesmo de qualquer averiguação da polícia britânica. Soou então o alerta vermelho não apenas na Inglaterra, mas na casa de seus patrões, os EUA. Com ele, foi deflagrada uma nova onda histérica, acompanhada de mais uma caça às bruxas (leia-se 'comunidade islâmica'). O monstro terrorista, que se explode e leva consigo criancinhas e inocentes indefesos em restaurantes, está à espreita novamente. Jornais como o inglês “The Times” escrevem que não apenas os muçulmanos radicais, mas também os moderados, são potencialmente responsáveis por não declararem sua aversão ao terrorismo.

Este tipo de comportamento da grande mídia ocidental não é de se estranhar, uma vez que quase toda ela é muda e subserviente aos desmandos e ao terrorismo oficial de Estados Unidos, Inglaterra e Israel, que invadem nações e territórios, violando continuamente as Leis Internacionais e as Resoluções da ONU. Israel, por exemplo, só se lembra da ONU para mencionar a resolução (aliás extremamente controversa) que deu origem a seu país. Quando se mencionam as mais de 60 resoluções não acatadas, a resposta das autoridades israelenses é invariável: “A ONU é um organismo antiamericano ou dominado por países árabes”.

Dentro destes países, muito além da realidade ‘real’, as ameaças terroristas são usadas como forma de colocar um cabresto na opinião pública e justificar mais intervenções contra outros povos, além de estigmatizar a oposição e aterrorizar estrangeiros residentes. “Se eles não gostam de nossa sociedade aberta, que voltem para seus países de origem”. Ou “eles se aproveitam de nossas democracias para miná-las internamente, que vão embora”. Por trás destes chavões surrados, oculta-se uma política que visa legitimar o preconceito racial e que pretende criar aparthaids contra imigrantes islâmicos, apresentando-os como incapazes de viver em sociedade. Pretende-se, também, mostrar a política norte-americana para o Oriente Médio como indispensável para ensinar aos ‘bárbaros’ islâmicos o que é democracia. Naquela região, uma vida inglesa, israelense ou norte-americana vale mais do que a de 500 mil iraquianos -número de mortos desde a invasão do Golfo, de 1991 até a queda de Saddam, em 2003, em consequências da contaminação pelo uso de bombas de urânio empobrecido. “É o preço a pagar pela liberdade”, como ensinou a ex-secretária norte-americana do governo Clinton, Madeleine Albright.

Se é verdade...

Se é verdade que os ataques terroristas mataram 3 mil pessoas nos EUA, também é verdade que o terrorismo de Estado norte-americano já é diretamente responsável pela morte de 1 milhão de pessoas no Afeganistão e Iraque, além do deslocamento de 6 milhões de seres humanos para países como Síria, Irã e Paquistão, criando novos barris de pólvora na região, sem infra-estrutura adequada para abrigar tanta gente.

Se é verdade que o terrorismo palestino ou islâmico matou cerca de 2 mil pessoas em Israel ao longo de 30 anos, também é verdade que Israel já matou mais de 50 mil civis e inocentes no mesmo período, sem contar militantes jihadistas e os mortos pelo terrorismo oficial daquele país, batizado de “assassinato seletivo”. Para Israel, EUA e Inglaterra, a mídia sempre dispõe de algum eufemismo para suavizar suas ações, tais como “assassinatos seletivos” no lugar de terrorismo; ou “ocupação”, em vez de “invasão”. Consciente ou inconscientemente, retoma-se o mesmo vocabulário do tempo da colonização britânica na Índia ou Oriente Médio.


Pequena lista de mentiras, distorções e omissões da mídia

Governo “terrorista” do Hamas – Eleito democraticamente no começo de 2006, antes mesmo que tomasse posse ou que adotasse qualquer tipo de conduta pró ou contra-Israel, o novo governo foi boicotado pelos EUA e nações ocidentais, e o dinheiro dos impostos palestinos foi confiscado por Israel. Sim, é verdade que o Hamas é inimigo figadal de Israel. No entanto, antes de qualquer tentativa de negociação, um governo democraticamente eleito foi sabotado, e mais de 2 milhões de pessoas foram deixadas à míngua, confinadas em dois territórios de maneira ainda mais indigna do que antes. O resultado foi uma briga fratricida entre milhares de desempregados, já atolados no banditismo comum a sociedades marginalizadas. Agora, Abbas surge como único representante legítimo da Palestina e Israel mostra sua “generosidade” ao repassar, mais de 1 ano depois, o dinheiro que sempre pertenceu àquele povo.

Em São Paulo, um dos quatro maiores jornais online do país, durante a data de aniversário dos 40 anos da Guerra dos Seis Dias, em 1967, entre Israel e países árabes, publicou exclusivamente o ponto de vista israelense (no dia 2 de junho), violando o princípio mais básico do jornalismo, que é ouvir a voz de todos os envolvidos em igualdade de condições. Apenas a partir do dia 5 de junho, a versão árabe foi apresentada.

Também há pouco mais de um mês, outro veículo da grande imprensa paulistana distorceu uma notícia sobre a morte por apedrejamento de uma jovem no Curdistão iraquiano. A culpa recaiu sobre os muçulmanos, sempre apresentados convenientemente como bárbaros incapazes de decidir seu próprio destino. No caso em questão, a jovem foi apedrejada por membros da seita zaidista, por haver se convertido ao Islã para se casar com um muçulmano. Exatamente o oposto do difundido pela referida publicação.

A imprensa pró-Ocidental se esforça continuamente para descaracterizar a insurgência iraquiana, classificando-a e a todos que combatem as forças americanas naquele país como “terroristas”. A mídia vende o conflito como uma guerra étnica, entre sunitas e xiitas. A presença de mais de 200 mil mercenários a soldo do exército norte-americano e das corporações petrolíferas simplesmente é omitida, bem como as ações das agências de inteligência na região.
O mesmo veículo de comunicação que omitira a visão árabe da Guerra dos Seis Dias, chega –por ocasião dos novos “atentados” na Inglaterra- ao absurdo de escrever que a preferência dos terroristas pela capital inglesa se deve ao fato de a Inglaterra ser uma sociedade aberta (como se os terroristas não cometessem atentados também na Argélia, no Marrocos, no Iêmen e até mesmo na Coréia do Norte) e ser forte candidata a centro financeiro mundial (Quais as grandes empresas inglesas? No que a Inglaterra se fortaleceu como centro financeiro mundial, desde a devolução de Hong Kong à China? Desde quando um artigo de “The Independent” serve como base para alguma afirmação econômica definitiva?). Não seria apenas por que a Inglaterra, junto com os EUA, invadiu o Iraque? Quantos atentados islâmicos houve na Grã-Bretanha antes da invasão anglo-americana ao Iraque?

A mídia não divulga, por exemplo, que, em janeiro de 2007, pesquisa realizada pelo Instituto Gallup –o de maior credibilidade em todo o Ocidente- mostrou que apenas 7% dos 1,4 bilhão de muçulmanos são favoráveis ou justificam, de alguma maneira, o terrorismo. Motivo: não interessa melhorar a imagem dos muçulmanos no mundo.

A mídia também omite que, hoje, cerca de 2/3 dos muçulmanos no mundo vivem em países democráticos ou nos quais a democracia avança.

Por trás das informações lançadas de forma bombástica ou distorcida ao público ocidental, percebe-se a verdadeira vocação da mídia servil aos interesses do capitalismo selvagem: a manipulação.

Leituras recomendadas (clique no tópico em verde para abrir o link)

Entrevista com Howard Zinn
Mídia

Ameaça à informação


Mídias em crise

Petróleo e petroleiras

Ora, a democracia


Caos e ira nos campos da Nigéria


A nova era do petróleo estatal