sexta-feira, 21 de março de 2008
O viciado
Os pais estavam muito preocupados. Não sabiam como agir diante do filho que, nos últimos três meses, havia alterado toda sua rotina. Assim que chegava da escola, almoçava rapidamente e, ato contínuo, saía de casa, sem dizer para onde ia. Voltava ao cair da tarde e, nem bem entrava, trancava-se no quarto. Não jantava. Não compartilhava, não conversava. Sequer assistia televisão com a família, o que era quase um ritual após o jantar.
Estava viciado, tudo levava a crer. Mas não havia indícios. Não havia novas companhias. O quarto sempre estava arrumado, sem odores diferentes. Também não usava adereços de nenhum tipo, não se tatuara, não cortara o cabelo em estilo moderno, enfim, nada. Que droga seria essa, pensou o pai? Não sei, não sei, disse a mãe, quase em desespero. Vamos procurar um especialista, precisamos conversar com alguém que já tenha passado por isso, disse o pai. Sim, vamos, concordou a mãe.
Procuraram um psicanalista indicado por um parente. Profissional renomado, com as melhores referências. Fez uma série de recomendações e, depois de cobrar seus honorários, os despediu, desejando-lhes boa sorte e retorno após um mês. Ou que telefonassem antes, caso houvesse alguma urgência.
Mas uma coisa intrigava o pai. De acordo com as descrições feitas, o filho deveria ter se tornado agressivo, com expressão alterada, olhos vermelhos, falando gírias. Mas isso não acontecera. Curiosamente, se tornara mais silencioso no andar, no abrir e fechar portas. Parecia não querer ser notado. E o rosto, que ele procurava manter sempre baixo, estava mais viçoso do que antes. Que droga será que inventaram desta vez, meu Deus, disse o pai. E a mãe rompia em choro.
O pai resolveu apelar. Não professava qualquer religião, mas acreditava vagamente em alguma coisa além do que seus sentidos e raciocínio lhe mostravam, e que, na falta de melhor definição, chamava de Deus. Hoje à noite vamos orar, disse à esposa. De olhos inchados, a mulher perguntou, Mas onde e como? Vamos à igreja, a um centro espírita? Não, vamos ficar aqui em casa mesmo, em nosso quarto, e rezamos do nosso jeito. Vamos tentar conversar com Deus. Está bem, concordou a esposa.
Depois que os ruídos na cidade diminuíram, trancaram-se, acenderam uma vela e começaram a falar no vazio, como se Deus fosse uma terceira pessoa em seu quarto. Disseram que eram lutadores, honestos e que, apesar de seus erros e fraquezas, não eram piores do que ninguém. Pediam orientação. Desculparam-se por só se lembrarem d’Ele nessa hora. Prometeram que, se tivessem resultado, se tornariam melhores devotos. Não ouviram nada, não sentiram nada, mas o pai teve uma idéia que não lhe ocorrera antes: conversar com o filho.
O pai precisou de alguns dias para preparar as palavras certas, para ajustar seu discurso, de forma a mostrar-se sábio, com o objetivo de atrair o filho e não afugentá-lo. Finalmente estava pronto. Numa ocasião em que o rapaz se encontrava trancado com a luz acesa fazia umas duas horas, o pai bateu em sua porta. O filho respondeu, Sim? Podemos conversar?, disse o pai. Só um momento, disse o filho. E abriu, timidamente, a porta. Posso entrar? Um segundo, disse o rapaz. Depois de uns cinco minutos, abriu toda a porta. O pai entrou. Notou que a cama estava com os lençóis amassados, como se o filho estivesse deitado.
De início um pouco trêmulo, o pai começou a falar. Depois, à medida em que o filho o ouvia sem se manifestar, ganhou confiança, e passou a falar sem balbuciar, de forma articulada e fluída. O filho o fitava, sereno. O pai confessou sua preocupação, seus medos, falou das desgraças do mundo. Chegou ao ponto. Suspeitava que o filho estivesse envolvido com alguma droga. Ele mudara seu comportamento, estava mais introspectivo, pouco conversava, só queria saber de ficar trancado. O jovem escutava, escutava e escutava, até que, de repente, começou a sorrir. Está bem, pai. Levantou então o lençol que cobria a beirada da cama e puxou, de debaixo dela, uma mochila. Abriu-a. Tirou de dentro “Adolphe”, de Benjamim Constant; “Os irmãos Karamazov”, de Fiodor Dostoievski; “Viagem ao azul”, de Ludwig Tieck e “A morte”, de Maurice Maeterlinck. Tirou também um conjunto de folhas escritas com sua letra. Pegou uma que parecia ser a mais velha de todas. Entregou-a ao pai:
palavras queimadas.
assim eram as formas
que subiam da manhã
como a névoa que se levanta
ao pé da montanha.
pareciam frias,
mas incensavam o ar;
pareciam brancas,
mas ardiam na garganta.
eram palavras queimadas
que saíam de dentro da manhã
como se o sol saísse de um
banho quente.
as procurávamos entre os vapores,
ensejávamos encontrá-las
brilhantes, torneadas,
só divisávamos o fumo que se elevava
do espaço vazio.
eram palavras queimadas.
não deixaram cinzas
gritos
saudades
nem o desejo de reerguer nada.
eram palavras queimadas.
Leitura recomendada (clique sobre o título para baixar o arquivo na íntegra)
segunda-feira, 3 de março de 2008
América do Sul em perigo: a agressão colombiana
O recente ataque da Colômbia à fronteira equatoriana coloca em risco a estabilidade e a paz na América do Sul, região que não conhece conflitos entre suas nações há décadas. A agressão foi uma decorrência da eliminação do número dois das Farc – Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, Raúl Reyes, morto com outros 16 guerrilheiros, após um ataque do exército colombiano a pouco mais de 1km dentro do Equador. O governo de Álvaro Uribe autorizou seu exército a invadir uma nação soberana, ferindo as Leis internacionais e colocando em risco a paz neste lado do continente.
Não há qualquer justificativa para a invasão colombiana. Se a presença de traficantes, terroristas e guerrilheiros servisse para justificar agressões, países como Brasil, EUA, Espanha ou quaisquer outros Estados soberanos deveriam ser invadidos periodicamente, pois são rota de toda sorte de marginais, além -muitas vezes- de serem residência de vários deles, caso do megatraficante colombiano Jorge Abadía. Como declarou a moderada presidente do Chile, Michelle Bachelet, "a Colômbia deve explicações ao Equador e a todos os países da região".
Como fiel aprendiz dos EUA, a Colômbia tenta agora acusar o Equador –país claramente inferiorizado em forças militares- de estar mancomunado com as Farc e de ser conivente com as ações da guerrilha, mencionando "documentos" que teriam sido encontrados junto aos militantes mortos, comprovando a ligação "estrutural" entre equatorianos e guerrilheiros. A cena lembra o depoimento fraudulento do ex-secretário de Estado norte-americano Colin Powell, junto à ONU, apresentando coordenadas, fotos e documentos falsos, numa tentativa de legitimar a invasão ao Iraque.
Embora Uribe tenha seus méritos junto à sua própria população e direito de combater a guerrilha em seu território, a invasão à fronteira equatoriana deixa claro que o governante colombiano conta com o respaldo americano para esta ação, sem temer indispor-se com as outras nações da região ou um conflito direto não apenas com o Equador, mas com o atual protetor dos países anti-EUA do continente: Hugo Chávez.
Da mesma forma que os EUA se arvoram em ser "protetores" de parte da humanidade ou de seus satélites, o líder venezuelano também tem pretensões na região e é sério candidato a interpretar papel semelhante ao dos norte-americanos. Sabe-se que, hoje, a Venezuela conta com o exército mais bem equipado da América do Sul. Num conflito direto entre países, dificilmente a Colômbia se daria bem sem o apoio explícito do governo Bush.
Recentemente, Hugo Chávez estabeleceu um pacto de defesa conjunta com os países mais à esquerda do continente, justamente Equador, Nicarágua e Bolívia. É impossível que Uribe não soubesse estar mexendo num vespeiro e que não contasse com o apoio dos EUA para sua incursão em território equatoriano. A situação, portanto, é extremamente delicada. É hora da diplomacia dos governos Lula, Cristina Kirchner e Bachellet agir rapidamente, para impedir que o pior aconteça na América do Sul.
Não há qualquer justificativa para a invasão colombiana. Se a presença de traficantes, terroristas e guerrilheiros servisse para justificar agressões, países como Brasil, EUA, Espanha ou quaisquer outros Estados soberanos deveriam ser invadidos periodicamente, pois são rota de toda sorte de marginais, além -muitas vezes- de serem residência de vários deles, caso do megatraficante colombiano Jorge Abadía. Como declarou a moderada presidente do Chile, Michelle Bachelet, "a Colômbia deve explicações ao Equador e a todos os países da região".
Como fiel aprendiz dos EUA, a Colômbia tenta agora acusar o Equador –país claramente inferiorizado em forças militares- de estar mancomunado com as Farc e de ser conivente com as ações da guerrilha, mencionando "documentos" que teriam sido encontrados junto aos militantes mortos, comprovando a ligação "estrutural" entre equatorianos e guerrilheiros. A cena lembra o depoimento fraudulento do ex-secretário de Estado norte-americano Colin Powell, junto à ONU, apresentando coordenadas, fotos e documentos falsos, numa tentativa de legitimar a invasão ao Iraque.
Embora Uribe tenha seus méritos junto à sua própria população e direito de combater a guerrilha em seu território, a invasão à fronteira equatoriana deixa claro que o governante colombiano conta com o respaldo americano para esta ação, sem temer indispor-se com as outras nações da região ou um conflito direto não apenas com o Equador, mas com o atual protetor dos países anti-EUA do continente: Hugo Chávez.
Da mesma forma que os EUA se arvoram em ser "protetores" de parte da humanidade ou de seus satélites, o líder venezuelano também tem pretensões na região e é sério candidato a interpretar papel semelhante ao dos norte-americanos. Sabe-se que, hoje, a Venezuela conta com o exército mais bem equipado da América do Sul. Num conflito direto entre países, dificilmente a Colômbia se daria bem sem o apoio explícito do governo Bush.
Recentemente, Hugo Chávez estabeleceu um pacto de defesa conjunta com os países mais à esquerda do continente, justamente Equador, Nicarágua e Bolívia. É impossível que Uribe não soubesse estar mexendo num vespeiro e que não contasse com o apoio dos EUA para sua incursão em território equatoriano. A situação, portanto, é extremamente delicada. É hora da diplomacia dos governos Lula, Cristina Kirchner e Bachellet agir rapidamente, para impedir que o pior aconteça na América do Sul.
segunda-feira, 24 de dezembro de 2007
PAI
Era uma vez um menino criado apenas pela mãe. Tão logo começou a ganhar entendimento das coisas, sua mãe contou-lhe que, pouco antes de nascer, o pai tivera de partir em uma longa viagem, sem prazo para retornar. Mas, apesar da distância, prometera jamais deixar de acompanhar o progresso do filho e sempre encontraria uma forma de saber como ele estava.
Dessa forma, o menino foi educado. Embora não tivesse nenhuma fotografia do pai e a mãe se recusasse a descrevê-lo fisicamente, era como se estivesse presente em tudo o que se dizia que a criança deveria ou não fazer. Quando o menino se empenhava nos estudos, ou quando era solícito para com outras pessoas, a mãe comentava: “Seu pai ficará feliz em saber do seu comportamento”. Por outro lado, quando o pequeno era traquinas ou dava mostras de superioridade perante os outros, novamente a sombra do pai era projetada sobre ele: “Vou contar o que você andou aprontando para o seu pai. Tenho certeza de que ele não vai gostar nada de saber o que você anda fazendo”.
E assim foi. No geral, o menino, que já ultrapassara a adolescência e se convertera em um jovem homem, fora obediente à maior parte das instruções transmitidas pela mãe, que falecera no início da juventude do rapaz. Crescera procurando ser digno, verdadeiro e bom, em resumo, seguira os conselhos que o pai lhe deixara.
No entanto, com a maturidade, o agora homem deixou de se satisfazer com a história do pai que, de algum local distante, vigiava seus passos. Quis saber mais. Aonde estaria? Que trabalho poderia ser tão importante que, em cerca de vinte anos, não lhe permitira fazer sequer uma visita ao filho? É certo que nada jamais faltara a ele. Fora educado da melhor maneira, com os melhores instrutores, e se saíra bem. Contudo, hoje ele compreendia que nada daquilo era realmente valioso se não conhecesse o responsável direto por sua vida e sucesso, que lhe ensinara a ser senhor de si mesmo.
Sem ter a quem recorrer, pois não tinha quaisquer parentes onde então vivia, pensou em usar uma foto de si mesmo como pista. Sim, certamente devia ter herdado os traços paternos. Achava-se muito diferente da mãe, portanto, deveria assemelhar-se ao pai.
Por onde começar?, perguntou-se. Para onde ir? Ao mesmo tempo, já era um homem de responsabilidades, tinha os negócios que a mãe lhe legara para cuidar, além de estar apaixonado por uma bela moça com quem prometera se casar. Qualquer tipo de busca envolveria o abandono de uma situação estável na qual, paradoxalmente, o próprio pai o colocara. Achou curioso que, no meio social em que vivia, todos o elogiavam por sua família, pelo pai dedicado que suprira todas suas necessidades materiais. Ele, contudo, estava só no mundo. E percebia isso cada vez mais claramente.
Naquela noite teve um sonho. Viu-se saltando do interior de um navio luxuoso e adornado, repleto de gente, para dentro do mar silencioso, sem uma bóia ou pedaço de material flutuante em que se agarrar. Apesar de sentir medo durante o salto, no momento do choque do corpo com a água, uma felicidade única o invadiu, compensando os riscos do que viesse depois.
Na manhã seguinte, assim como o pai fizera consigo, partiu, deixando instruções a respeito da condução dos negócios e uma carta emocionada à noiva, garantindo-lhe fidelidade e pedindo perdão pela atitude inevitável.
Sem rumo, levando consigo apenas uma foto de si mesmo, a roupa do corpo e algum dinheiro, tomou um trem desconhecendo para onde deveria ir. Olhando para fora do trem em movimento, a paisagem não representava mais do que um aglomerado de imagens que se sucediam, árvores, postes, casas, pessoas, animais, e depois a escuridão que a tudo afogava, alternada com as poucas luzes que insistiam em não apagar.
Adormeceu. Ao amanhecer, chegou a uma cidade um pouco menor que a sua. Ele sabia que não encontraria seu pai por lá –embora, quem sabe, ele pudesse estar ali, por que não?. Resolveu deter-se naquele lugar. Confuso mas determinado, sentou-se em um banco de praça para decidir o que fazer. Ficaria ali por algum tempo, até ter uma idéia mais clara para onde seguir. Ao menos, pensava, ninguém mais diria que seu pai o provia ou zelava por ele onde quer que estivesse. Ali era um estranho. Pela primeira vez, sentiria a ausência completa do pai.
Passaram-se meses, o jovem tornou-se empregado em um escritório local e, por seu empenho, dedicação e honestidade, rapidamente granjeou a admiração alheia, ascendendo a um novo cargo. Outra vez, encontrava-se em situação estável, havendo várias mulheres que se insinuavam para ele. Certo dia em que o fogo da juventude queimou-lhe do ventre à garganta por uma bela moça que o fitava com lascívia, um lampejo atravessou sua mente: Em que ele diferia do jovem que saíra de sua cidade natal? Voltara à situação anterior, só que sem o pai. Lembrou-se que o motivo que o levara até ali não era a admiração das outras pessoas ou o desejo das mulheres, mas encontrar o próprio pai. Mas encontrá-lo onde? Quem garante que por todas as cidades por onde eu passe não acontecerá a mesma coisa? Não estarei ficando louco? Por que procurar por meu pai, no final das contas? Por que não desfrutar da vida como ela é, constituir família e esquecer definitivamente alguém que jamais me procurou enquanto estive à sua disposição, dedicando-me a agrada-lo?
No entanto, a saudade e o desejo de encontrar o pai sobrepujavam qualquer outro sentimento dentro de si. Não tinha qualquer outra ambição. Não aprendera o valor das coisas materiais além de seu significado comum; não sentia afã, apego por nada. A vida, tal como a via vivida pelos outros, não lhe interessava. As pequenas batalhas do dia-a-dia, a luta por dinheiro, por reconhecimento, por sexo, por prazer, tudo lhe parecia distante como se estivesse no alto de uma montanha e enxergasse, lá embaixo, as pessoas pequenas e certas de que suas vidas e seus problemas eram os assuntos mais importantes do universo, sem a noção da grandeza que as rodeava. No entanto, acima da montanha havia o céu, cortado por nuvens douradas e avermelhadas, imerso no silêncio.
Outra vez decidira partir. Dessa vez, sem despedir-se ou deixar correspondência. Iria para onde, meu Deus?, pensou. Para onde pudesse refletir sobre o melhor lugar para procurar o pai. Perambulou por cidades e vilas minúsculas junto ao campo. Bem apessoado e vestido, educado e cortês, não demorava a conseguir trabalho, embora, mais do que na ocasião anterior, despertasse a curiosidade da gente do campo. Todos queriam saber quem era, o que fazia por ali, por que –não o diziam diretamente, mas transpareciam a dúvida- resolvera misturar-se com aquelas pessoas simples, em locais pobres e sem perspectivas. O que esperava achar por ali? Seria um enganador, interessado em lesar pessoas humildes e sem cultura?
Da primeira vez, ninguém perguntou quem ele era. Agora, acontecia o contrário. E como não obtivessem resposta alguma que os satisfizesse, começaram a criar lendas e histórias a seu respeito. Percebeu, porém, que pobres e ricos, campesinos ou citadinos, todos se encontravam num ponto: não conseguiam entender, nem acreditar, que ele pudesse perder seu tempo procurando o pai pelo mundo. Muitos invejavam seu porte, educação e facilidade para obter favores e conquistar a admiração alheia. Outros gostavam sinceramente dele, por sua nobreza e delicadeza no agir e falar. Uma minoria o temia –quem seria ele, o que quer de nós?, pensavam. Estavam todos, sem exceção, engalfinhados na luta pela vida, que, na maior parte das vezes, não acontecia com o corpo, no trabalho, mas dentro de si mesmos, através das preocupações, expectativas e ilusões. Não tinham espaço para mais nada a não ser pensar em ganhar, acumular, enriquecer, proteger-se, destacar-se, dormir e voltar a fazer a mesma coisa no dia seguinte.
O pai voltou-lhe à mente e sua suposta imagem fincou-se em seu coração, como um destino. Era sua razão de viver. O que fora feito dele? E se não encontrasse o pai, o que aconteceria? Não conseguia viver naquele mundo que parecia um turbilhão, mas, ao mesmo tempo, não achara o pai. Estaria condenado a perambular? Nada o prendia àquela cidade, àquele povo. Nada o prendia a lugar algum. Novamente, resolvera partir. Tomara, porém, uma nova decisão. Não sairia dali enquanto não recebesse um sinal da localização de seu pai ou de que fim levara.
Ocorreu-lhe então que deveria tentar lembrar-se do pai o máximo possível, tê-lo em mente a cada instante. Recordou-se que, em seus primeiros anos, era a mãe quem sempre lhe falava do pai, instando-o a ser o melhor possível para alegrar aquele que o amava e zelava pelo seu bem-estar. Agora seria diferente. Ele se lembraria do pai espontaneamente. Pai, quero saber onde você está, tenho certeza que não está longe. Amo-o, será que não sente isso? Por favor, não quero morrer, mas também não conseguirei viver muito mais tempo dessa forma. Ajude-me a chegar até você, pedia em seu interior.
Na mesma noite, teve um sonho. Viu uma porta se abrindo e uma mão, semioculta sob a manga de um manto, se esgueirava em sua direção, chamando-o para entrar. Ele o fazia e, no instante seguinte, encontrava-se diante de alguém cujo rosto não podia ser visto. Ao despertar, identificou o aposento do sonho com seu antigo quarto.
Sem saber exatamente porquê, resolveu voltar para casa. Alguns anos já se haviam passado, usava barba, sua pele ficara tostada pela vida ao ar livre. Não seria reconhecido facilmente. Nem o queria, para dizer a verdade. Como estariam a ex-noiva, as pessoas que incumbira de seus negócios? Eram apenas pensamentos fortuitos. Não voltava pela noiva ou pelos negócios, não pretendia cobrar ou exigir nada. Seria insensível por pensar assim?
Pai, o que você me fez fazer? Terei abandonado os que me amavam apenas para encontrá-lo? No que você é melhor do que eles? Terei seu amor quando o encontrar? Quem garante que não sou um órfão e que minha mãe, por piedade, não inventou a história de sua ausência?, pensava. Metade do seu ser, contudo, opinava de maneira diferente. Não havia outra alternativa. Estava condenado à morte em vida, à hipocrisia de uma existência sem sentido, feita de anseios e conversações inúteis, de prazer insaciável e da luta contra a dor e a miséria que caracterizam o espírito humano. De repente, percebera que, em todos aqueles anos, jamais temera qualquer situação de penúria ou perda material. Seu único medo era morrer sem encontrar o pai, sem descobri-lo.
Ao voltar à cidade natal, reconheceu cada lugar, com ou sem modificações. Sabia distinguir as coisas novas que haviam sido acrescentadas desde sua partida. Foi para sua velha casa, vestido como um camponês, a pele tostada e a barba por fazer, com uma sacola de algodão cru a tira-colo. Não tinha mais o porte de outrora, nem preocupava-se com isso. Ao chegar à casa onde fora criado, tocou a campainha. Ninguém veio. Tocou outra vez. Lentamente, passos aproximaram-se da antiga porta de madeira. Apareceu um homem desconhecido, pouco mais jovem do que ele, mas bem vestido.
Quem vive nesta casa, perguntou. Só um antigo membro da família do sr. e sra. tal, respondeu o criado. Por acaso, ouviu falar de um antigo morador desta residência, que se chamava tal? Sim, ouvi. Desapareceu há alguns anos, após haver entregue todos seus negócios e ter deixado uma carta de despedida à noiva, respondeu novamente o homem. E quem vive aqui, atualmente?, perguntou o jovem com aspecto campônio. O sr. tal, pai do jovem que, tempos atrás, abandonou esta casa.
Quase desmaiou. Empalideceu e sentiu o suor escorrer pelo corpo. Como podia ser? Ele, que perambulara anos a fio por lugares onde acreditava que pudesse encontrar algum sinal do pai, o acharia na própria casa? Preciso entrar, disse ao criado. Mas este, recomposto das inúmeras perguntas de que fora alvo, disse-lhe Não. Deixe-me passar, por favor. Este homem é meu pai. Eu sou aquele que, há muitos anos, partiu em busca daquele que hoje mora nesta casa. Sinto muito, não acredito, disse o empregado. Como alguém tão rude como você pode ser filho do sr. tal? Você não corresponde à descrição dele, disse. Por sorte, guardava junto a si a própria fotografia. Veja. O homem olhou a imagem, quase encostando-a na ponta do nariz, e a devolveu. Espere um momento, falou, fechando a porta atrás de si.
Passados cerca de quinze minutos, retornou. Pode entrar, disse o homem, com olhar desconfiado. Atravessou o umbral e penetrou na casa, a mesma que deixara numa madrugada cuja data não podia precisar. Nada mudara. Os móveis pareciam estar pregados aos seus antigos lugares, o corrimão da escada mantinha-se lustroso, os tapetes e quadros permaneciam incólumes. Parecia-lhe que nunca saíra daquela casa, que tudo não passava de um sonho. Talvez fosse, talvez nunca tivesse partido, talvez estivesse apenas dormindo. Tocou o próprio rosto e sentiu a barba que ocultava a face outrora de traços suaves; olhou para as próprias roupas e compreendeu que sim, que estava de volta ao lar depois de muito tempo. Como se despertasse, dirigiu-se com passos firmes ao seu antigo quarto, sua única dormida enquanto vivera naquela casa. Pela porta entreaberta, uma mão firme, sobre a qual incidia uma luz, acenava para que entrasse e finalmente encontrasse a razão de sua vida.
Dessa forma, o menino foi educado. Embora não tivesse nenhuma fotografia do pai e a mãe se recusasse a descrevê-lo fisicamente, era como se estivesse presente em tudo o que se dizia que a criança deveria ou não fazer. Quando o menino se empenhava nos estudos, ou quando era solícito para com outras pessoas, a mãe comentava: “Seu pai ficará feliz em saber do seu comportamento”. Por outro lado, quando o pequeno era traquinas ou dava mostras de superioridade perante os outros, novamente a sombra do pai era projetada sobre ele: “Vou contar o que você andou aprontando para o seu pai. Tenho certeza de que ele não vai gostar nada de saber o que você anda fazendo”.
E assim foi. No geral, o menino, que já ultrapassara a adolescência e se convertera em um jovem homem, fora obediente à maior parte das instruções transmitidas pela mãe, que falecera no início da juventude do rapaz. Crescera procurando ser digno, verdadeiro e bom, em resumo, seguira os conselhos que o pai lhe deixara.
No entanto, com a maturidade, o agora homem deixou de se satisfazer com a história do pai que, de algum local distante, vigiava seus passos. Quis saber mais. Aonde estaria? Que trabalho poderia ser tão importante que, em cerca de vinte anos, não lhe permitira fazer sequer uma visita ao filho? É certo que nada jamais faltara a ele. Fora educado da melhor maneira, com os melhores instrutores, e se saíra bem. Contudo, hoje ele compreendia que nada daquilo era realmente valioso se não conhecesse o responsável direto por sua vida e sucesso, que lhe ensinara a ser senhor de si mesmo.
Sem ter a quem recorrer, pois não tinha quaisquer parentes onde então vivia, pensou em usar uma foto de si mesmo como pista. Sim, certamente devia ter herdado os traços paternos. Achava-se muito diferente da mãe, portanto, deveria assemelhar-se ao pai.
Por onde começar?, perguntou-se. Para onde ir? Ao mesmo tempo, já era um homem de responsabilidades, tinha os negócios que a mãe lhe legara para cuidar, além de estar apaixonado por uma bela moça com quem prometera se casar. Qualquer tipo de busca envolveria o abandono de uma situação estável na qual, paradoxalmente, o próprio pai o colocara. Achou curioso que, no meio social em que vivia, todos o elogiavam por sua família, pelo pai dedicado que suprira todas suas necessidades materiais. Ele, contudo, estava só no mundo. E percebia isso cada vez mais claramente.
Naquela noite teve um sonho. Viu-se saltando do interior de um navio luxuoso e adornado, repleto de gente, para dentro do mar silencioso, sem uma bóia ou pedaço de material flutuante em que se agarrar. Apesar de sentir medo durante o salto, no momento do choque do corpo com a água, uma felicidade única o invadiu, compensando os riscos do que viesse depois.
Na manhã seguinte, assim como o pai fizera consigo, partiu, deixando instruções a respeito da condução dos negócios e uma carta emocionada à noiva, garantindo-lhe fidelidade e pedindo perdão pela atitude inevitável.
Sem rumo, levando consigo apenas uma foto de si mesmo, a roupa do corpo e algum dinheiro, tomou um trem desconhecendo para onde deveria ir. Olhando para fora do trem em movimento, a paisagem não representava mais do que um aglomerado de imagens que se sucediam, árvores, postes, casas, pessoas, animais, e depois a escuridão que a tudo afogava, alternada com as poucas luzes que insistiam em não apagar.
Adormeceu. Ao amanhecer, chegou a uma cidade um pouco menor que a sua. Ele sabia que não encontraria seu pai por lá –embora, quem sabe, ele pudesse estar ali, por que não?. Resolveu deter-se naquele lugar. Confuso mas determinado, sentou-se em um banco de praça para decidir o que fazer. Ficaria ali por algum tempo, até ter uma idéia mais clara para onde seguir. Ao menos, pensava, ninguém mais diria que seu pai o provia ou zelava por ele onde quer que estivesse. Ali era um estranho. Pela primeira vez, sentiria a ausência completa do pai.
Passaram-se meses, o jovem tornou-se empregado em um escritório local e, por seu empenho, dedicação e honestidade, rapidamente granjeou a admiração alheia, ascendendo a um novo cargo. Outra vez, encontrava-se em situação estável, havendo várias mulheres que se insinuavam para ele. Certo dia em que o fogo da juventude queimou-lhe do ventre à garganta por uma bela moça que o fitava com lascívia, um lampejo atravessou sua mente: Em que ele diferia do jovem que saíra de sua cidade natal? Voltara à situação anterior, só que sem o pai. Lembrou-se que o motivo que o levara até ali não era a admiração das outras pessoas ou o desejo das mulheres, mas encontrar o próprio pai. Mas encontrá-lo onde? Quem garante que por todas as cidades por onde eu passe não acontecerá a mesma coisa? Não estarei ficando louco? Por que procurar por meu pai, no final das contas? Por que não desfrutar da vida como ela é, constituir família e esquecer definitivamente alguém que jamais me procurou enquanto estive à sua disposição, dedicando-me a agrada-lo?
No entanto, a saudade e o desejo de encontrar o pai sobrepujavam qualquer outro sentimento dentro de si. Não tinha qualquer outra ambição. Não aprendera o valor das coisas materiais além de seu significado comum; não sentia afã, apego por nada. A vida, tal como a via vivida pelos outros, não lhe interessava. As pequenas batalhas do dia-a-dia, a luta por dinheiro, por reconhecimento, por sexo, por prazer, tudo lhe parecia distante como se estivesse no alto de uma montanha e enxergasse, lá embaixo, as pessoas pequenas e certas de que suas vidas e seus problemas eram os assuntos mais importantes do universo, sem a noção da grandeza que as rodeava. No entanto, acima da montanha havia o céu, cortado por nuvens douradas e avermelhadas, imerso no silêncio.
Outra vez decidira partir. Dessa vez, sem despedir-se ou deixar correspondência. Iria para onde, meu Deus?, pensou. Para onde pudesse refletir sobre o melhor lugar para procurar o pai. Perambulou por cidades e vilas minúsculas junto ao campo. Bem apessoado e vestido, educado e cortês, não demorava a conseguir trabalho, embora, mais do que na ocasião anterior, despertasse a curiosidade da gente do campo. Todos queriam saber quem era, o que fazia por ali, por que –não o diziam diretamente, mas transpareciam a dúvida- resolvera misturar-se com aquelas pessoas simples, em locais pobres e sem perspectivas. O que esperava achar por ali? Seria um enganador, interessado em lesar pessoas humildes e sem cultura?
Da primeira vez, ninguém perguntou quem ele era. Agora, acontecia o contrário. E como não obtivessem resposta alguma que os satisfizesse, começaram a criar lendas e histórias a seu respeito. Percebeu, porém, que pobres e ricos, campesinos ou citadinos, todos se encontravam num ponto: não conseguiam entender, nem acreditar, que ele pudesse perder seu tempo procurando o pai pelo mundo. Muitos invejavam seu porte, educação e facilidade para obter favores e conquistar a admiração alheia. Outros gostavam sinceramente dele, por sua nobreza e delicadeza no agir e falar. Uma minoria o temia –quem seria ele, o que quer de nós?, pensavam. Estavam todos, sem exceção, engalfinhados na luta pela vida, que, na maior parte das vezes, não acontecia com o corpo, no trabalho, mas dentro de si mesmos, através das preocupações, expectativas e ilusões. Não tinham espaço para mais nada a não ser pensar em ganhar, acumular, enriquecer, proteger-se, destacar-se, dormir e voltar a fazer a mesma coisa no dia seguinte.
O pai voltou-lhe à mente e sua suposta imagem fincou-se em seu coração, como um destino. Era sua razão de viver. O que fora feito dele? E se não encontrasse o pai, o que aconteceria? Não conseguia viver naquele mundo que parecia um turbilhão, mas, ao mesmo tempo, não achara o pai. Estaria condenado a perambular? Nada o prendia àquela cidade, àquele povo. Nada o prendia a lugar algum. Novamente, resolvera partir. Tomara, porém, uma nova decisão. Não sairia dali enquanto não recebesse um sinal da localização de seu pai ou de que fim levara.
Ocorreu-lhe então que deveria tentar lembrar-se do pai o máximo possível, tê-lo em mente a cada instante. Recordou-se que, em seus primeiros anos, era a mãe quem sempre lhe falava do pai, instando-o a ser o melhor possível para alegrar aquele que o amava e zelava pelo seu bem-estar. Agora seria diferente. Ele se lembraria do pai espontaneamente. Pai, quero saber onde você está, tenho certeza que não está longe. Amo-o, será que não sente isso? Por favor, não quero morrer, mas também não conseguirei viver muito mais tempo dessa forma. Ajude-me a chegar até você, pedia em seu interior.
Na mesma noite, teve um sonho. Viu uma porta se abrindo e uma mão, semioculta sob a manga de um manto, se esgueirava em sua direção, chamando-o para entrar. Ele o fazia e, no instante seguinte, encontrava-se diante de alguém cujo rosto não podia ser visto. Ao despertar, identificou o aposento do sonho com seu antigo quarto.
Sem saber exatamente porquê, resolveu voltar para casa. Alguns anos já se haviam passado, usava barba, sua pele ficara tostada pela vida ao ar livre. Não seria reconhecido facilmente. Nem o queria, para dizer a verdade. Como estariam a ex-noiva, as pessoas que incumbira de seus negócios? Eram apenas pensamentos fortuitos. Não voltava pela noiva ou pelos negócios, não pretendia cobrar ou exigir nada. Seria insensível por pensar assim?
Pai, o que você me fez fazer? Terei abandonado os que me amavam apenas para encontrá-lo? No que você é melhor do que eles? Terei seu amor quando o encontrar? Quem garante que não sou um órfão e que minha mãe, por piedade, não inventou a história de sua ausência?, pensava. Metade do seu ser, contudo, opinava de maneira diferente. Não havia outra alternativa. Estava condenado à morte em vida, à hipocrisia de uma existência sem sentido, feita de anseios e conversações inúteis, de prazer insaciável e da luta contra a dor e a miséria que caracterizam o espírito humano. De repente, percebera que, em todos aqueles anos, jamais temera qualquer situação de penúria ou perda material. Seu único medo era morrer sem encontrar o pai, sem descobri-lo.
Ao voltar à cidade natal, reconheceu cada lugar, com ou sem modificações. Sabia distinguir as coisas novas que haviam sido acrescentadas desde sua partida. Foi para sua velha casa, vestido como um camponês, a pele tostada e a barba por fazer, com uma sacola de algodão cru a tira-colo. Não tinha mais o porte de outrora, nem preocupava-se com isso. Ao chegar à casa onde fora criado, tocou a campainha. Ninguém veio. Tocou outra vez. Lentamente, passos aproximaram-se da antiga porta de madeira. Apareceu um homem desconhecido, pouco mais jovem do que ele, mas bem vestido.
Quem vive nesta casa, perguntou. Só um antigo membro da família do sr. e sra. tal, respondeu o criado. Por acaso, ouviu falar de um antigo morador desta residência, que se chamava tal? Sim, ouvi. Desapareceu há alguns anos, após haver entregue todos seus negócios e ter deixado uma carta de despedida à noiva, respondeu novamente o homem. E quem vive aqui, atualmente?, perguntou o jovem com aspecto campônio. O sr. tal, pai do jovem que, tempos atrás, abandonou esta casa.
Quase desmaiou. Empalideceu e sentiu o suor escorrer pelo corpo. Como podia ser? Ele, que perambulara anos a fio por lugares onde acreditava que pudesse encontrar algum sinal do pai, o acharia na própria casa? Preciso entrar, disse ao criado. Mas este, recomposto das inúmeras perguntas de que fora alvo, disse-lhe Não. Deixe-me passar, por favor. Este homem é meu pai. Eu sou aquele que, há muitos anos, partiu em busca daquele que hoje mora nesta casa. Sinto muito, não acredito, disse o empregado. Como alguém tão rude como você pode ser filho do sr. tal? Você não corresponde à descrição dele, disse. Por sorte, guardava junto a si a própria fotografia. Veja. O homem olhou a imagem, quase encostando-a na ponta do nariz, e a devolveu. Espere um momento, falou, fechando a porta atrás de si.
Passados cerca de quinze minutos, retornou. Pode entrar, disse o homem, com olhar desconfiado. Atravessou o umbral e penetrou na casa, a mesma que deixara numa madrugada cuja data não podia precisar. Nada mudara. Os móveis pareciam estar pregados aos seus antigos lugares, o corrimão da escada mantinha-se lustroso, os tapetes e quadros permaneciam incólumes. Parecia-lhe que nunca saíra daquela casa, que tudo não passava de um sonho. Talvez fosse, talvez nunca tivesse partido, talvez estivesse apenas dormindo. Tocou o próprio rosto e sentiu a barba que ocultava a face outrora de traços suaves; olhou para as próprias roupas e compreendeu que sim, que estava de volta ao lar depois de muito tempo. Como se despertasse, dirigiu-se com passos firmes ao seu antigo quarto, sua única dormida enquanto vivera naquela casa. Pela porta entreaberta, uma mão firme, sobre a qual incidia uma luz, acenava para que entrasse e finalmente encontrasse a razão de sua vida.
quinta-feira, 15 de novembro de 2007
...sem olhar a quem
Passava da meia-noite. Eu me encontrava em um restaurante italiano na região central de São Paulo, de pé no balcão de atendimento, à espera da pizza que havia encomendado. De repente, um homem se aproxima da entrada do estabelecimento. Cambaleante, de cabelos grisalhos, sujo e com as roupas amarrotadas, ele pára na porta, me olha e diz:
“Doutor, o senhor pode me arrumar um real? É o que falta para eu comprar minha pinga...”
Olho para ele fixamente, dou uma gargalhada, ponho a mão no bolso, tiro uma moeda de R$ 1,00 e a lanço em sua direção, como se jogasse cara ou coroa. A moeda rodopia no ar, até cair em sua mão.
Frases
De “O Profeta”, de Gibran Khalil Gibran
Muitas vezes dizes: “Eu daria, mas somente a quem merece.”
As árvores de vosso pomar não falam assim, nem o rebanho em vosso pasto.
Dão para viver, pois reter é perecer.
******
Então, um homem rico disse: “Fala-nos da dádiva.”
E ele respondeu:
Dais muito pouco quando dais do que tendes.
É quando derdes de vós mesmos que realmente dareis.
Porque, o que são vossas posses senão coisas que guardais e vigiais pelo medo que tendes que delas necessiteis amanhã?
E amanhã, o que trará o amanhã ao cão ultraprudente que enterra seus ossos na areia sem marcas, enquanto segue os peregrinos à cidade santa?
******
Das “Oito Aprendizagens”, de Hatim al-Asamm
(...) Vi que todos os seres humanos corriam atrás dos bens do mundo, se apropriavam e guardavam com avidez. Meditei então sobre a palavra de Deus: “Vossos bens são perecíveis, os bens de Deus são eternos (Corão 16; 98)”. Daquilo que eu possuía, então, me desprendi por amor a Deus e o distribuí aos pobres para que fosse para mim um tesouro ante os olhos de Deus. (...)
(...) Vi que todos os seres humanos confiavam nas criaturas: no dinheiro, nos bens e na propriedade, no ofício e na indústria, ou finalmente em outro ser humano. Meditei então sobre a palavra de Deus: “Deus basta para aquele que confia n’Ele. Ele realiza sempre seus desígnios. E os realiza ao seu tempo. (Corão 65; 3)”. Tenho, pois, plena confiança em Deus, que Ele me basta e que é O melhor dos protetores. (...)
Leituras recomendadas
“O Profeta”, Gibran Khalil Gibran
“O Sermão da Montanha”, Novo Testamento, Bíblia Sagrada
Todos os livros de Albert Schweitzer
Visitas
Brasil – Igreja e túmulo de Nhá Chica, na cidade de Baependi (MG)
Turquia – Túmulo de Jalalludin Rumi, poeta e santo islâmico, em Konya
sexta-feira, 26 de outubro de 2007
A vida secreta nos sonhos
Cerca de 1/3 de nossa vida é passada em estado de inconsciência, melhor dito, de sono. Apesar disso, esse importante período é praticamente ignorado pela ciência moderna como representativo da atividade humana. Considera-se que, enquanto dorme, a pessoa não faz nada de útil. O sono é apenas o momento em que o corpo repousa para recuperar energias. Contudo, este ‘não-lugar’ onde o homem permanece oito horas por dia é palco de uma atividade intensa: o sonho.
Na cultura ocidental moderna, foi o pai da psicanálise, Sigmund Freud, quem iniciou o estudo dos sonhos, vinculando-os a complexos, medos e principalmente à sexualidade. Já seu discípulo e quase antagonista, Carl Gustav Jung, percebia os sonhos como um mundo mítico, mitológico e arquetípico, que poderia vir à tona trazendo conhecimentos ancestrais, anteriores à própria existência do sonhador. A esse fenômeno o psicanalista suíço dava o nome de ‘inconsciente coletivo’.
Na literatura e nas artes, o sonho ganhou destaque com o surrealismo, movimento deflagrado pelo poeta francês André Breton, em 1924. Até então, representações de sonhos e pesadelos podiam ser encontrados nas pinturas de Peter Brueghel, Hyeronimus Bosch e Goya ou em passagens eventuais da literatura. Com o surrealismo, porém, o sonho passa da condição de elemento casual na arte para tornar-se um método para a construção da própria obra.
Com base nas descobertas psicanalíticas, o surrealismo introduz o conceito de "automatismo psíquico" (fluxo ininterrupto da linguagem) para libertar o conteúdo onírico da alma, fundindo real e imaginário, para que o artista se expresse sem travas ou restrições, com seus claros e escuros. Os sonhos se tornam matéria-prima para a criação artística.
A partir de 1926, o surrealismo invade a arte. O cinema (com “Um cão andaluz”, de Luis Buñuel e Salvador Dali), a literatura, o teatro (“Assim que Passem Cinco Anos”, de Garcia Lorca), a poesia (Lorca, Aleixandre, Alberti, Octavio Paz, René Char, Breton, Neruda, Dylan Thomas, Murilo Mendes), a pintura (com Dali, Max Ernst, Magritte, Miró, Picasso, Wilfredo Lam, Ismael Nery), a escultura, mesmo a comédia de televisão passam a receber influência –ainda que indireta e diluída- da linguagem onírica. Hoje, qualquer clipe de música traz imagens de cunho surrealista. A própria palavra tornou-se sinônimo de uma situação impossível, que ocorre abruptamente no cotidiano.
Um dos exemplos pitorescos dessa visão está numa anedota sobre o poeta surrealista francês Saint Paul Roux, que, ao deitar-se para dormir, pendurava do lado de fora da porta um cartaz onde estava escrito: “Poeta trabalhando”.
Os sonhos e as religiões
Se a arte só oficializou o sonho como protagonista da linguagem a partir do surrealismo, o mesmo não se pode dizer das religiões, onde sempre teve destaque. Para as religiões, o sonho representa a continuidade da vida do eu num universo sem matéria (o sono), para o qual se vai e vem diariamente.
Na interpretação psicanalítica os sonhos são o resultado de desejos e pulsões inconscientes. Mas, na visão espiritualista, o sonho representa a comunicação do mundo sutil com o homem. É através dele que se recebem presságios (como entre os gregos politeístas), profecias (como com o monoteísta José, no Egito, com a interpretação dos sonhos do faraó), revelações e intuições (como entre os índios hopi, animistas).
O sonho é a consciência desperta do eu dentro do mundo do sono (que os antigos poetas chamavam de “pequena morte”). Assim como no estado de vigília pode-se levar uma vida fragmentada ou mais consciente, também durante os sonhos pode-se ter mais ou menos clareza. Há diversos tipos de sonhos, desde aqueles que parecem não ter sentido algum para a pessoa, até aqueles que são nítidos e que trazem, após o despertar, uma mensagem específica ou a sensação de experiência vivida.
Os sonhos e seu conteúdo variam com a qualidade da vida interior que o indivíduo (o “sonhador”) leva em seu dia a dia. Pessoas que vivem apenas para seus afazeres e interesses materiais, sem um olhar transcendente, em geral têm sonhos dispersos, desconexos, sem relação aparente com nada. Estes quase sempre são esquecidos, tão logo se desperte. Às vezes, sequer há a lembrança de se haver sonhado.
Há sonhos pesados, terríveis –chamados pesadelos- que podem tanto ser o efeito do desgaste corporal e psíquico sobre o eu, como podem simbolizar medos internos e ocultos. Mas podem, também, ser o meio pelo qual o eu profundo procura comunicar algo de relevante à pessoa, na forma de imagens e sensações que causam transtorno.
Porém, para quem reconhece interiormente a existência de uma realidade espiritual, e que pauta sua vida não apenas em satisfazer suas necessidades materiais, mas em servir ao semelhante, com plena consciência de que a morte pode chegar a qualquer momento, o mundo dos sonhos não é mais um mundo sem sentido ou com sentido oculto. Ele se torna uma porta para um plano maior, onde o eu é ensinado e preparado, recebendo orientações de cunho moral, material, psicológico e espiritual.
O grande mestre e sheikh sufi (muçulmano) Muzaffer Ozaki, da ordem Halveti Jerrahi, dizia que (...) “ao dormir, a alma abandona o corpo, mas sem perder sua conexão com ele, como a luz que sai de uma lanterna. Essa luz se estende até a tela divina, onde ficam registradas as anotações que lhe dizem respeito. Ao despertar, a luz da alma volta ao corpo, como quando se desliga uma lanterna. Por meio da extensão da alma, o sonhador pode perceber um nível de conhecimento que se encontra além de seu domínio, no âmbito do divino.”
“(...) Os símbolos e imagens dos sonhos são como hieróglifos que podem ser lidos por pessoas experientes. Mas estes símbolos mudam de situação para situação, de pessoa para pessoa, de alma para alma. (...)
Nunca se deveria contar os sonhos a alguém que tem o hábito de falar mal dos outros. Eles só devem ser contados para aquelas pessoas cujas bocas estão limpas.”
Uma narrativa do sheikh Muzzafer Ozak
“Um dervixe que vivia no campo, longe da cidade onde seu mestre morava, teve um sonho. Sentia que era um sonho importante e que devia contá-lo a seu mestre imediatamente. Ele sonhara que seu corpo inchava como se fosse uma mulher grávida. Então, saía uma serpente de sua barriga e seu corpo voltava ao tamanho normal.
Como estava muito ocupado para visitar seu mestre, o dervixe chamou um de seus empregados de confiança. Contou-lhe o sonho e mandou-o para a cidade, para que procurasse e contasse ao seu mestre. O criado foi orientado para que não contasse o sonho a mais ninguém, e que até mesmo evitasse pensar nele. O dervixe sabia que era muito importante revelar seus sonhos apenas àquela pessoa que pudesse interpretá-lo.
O empregado partiu imediatamente à cidade. Pelo caminho, encontrou um conhecido que tinha fama de linguarudo. Este homem lhe perguntou o que estava fazendo ali e o criado respondeu que ia até a cidade. “O que você vai fazer por lá?”, perguntou o linguarudo.
O empregado respondeu: “Tenho que levar uma mensagem da parte de meu senhor.”
“Que mensagem?”
“É confidencial.”
O homem continuou pressionando o empregado para que desse mais detalhes até que, finalmente, este contou que estava indo ver o mestre de seu amo, para contar-lhe o sonho que havia tido na noite anterior
O linguarudo começou, então, a perguntar-lhe de que se tratava o sonho. No começo, o empregado se negou a contar, mas finalmente acabou por ceder. “Meu amo sonhou que inchava”.
Sem esperar o fim da narrativa, o linguarudo começou a rir e disse: “Então ele estourou, como um balão furado por uma agulha”. Tão logo satisfez sua curiosidade, foi embora.
O criado apressou-se a chegar á cidade, indo diretamente à casa do mestre. Quando foi recebido, disse: “Meu senhor teve um sonho na noite passada e roga que o senhor o interprete. Ele sonhou que seu corpo inchava...”
“Páre!”, disse de repente o mestre. “O sonho já foi interpretado. Não há mais nada que eu possa fazer. Volte para sua casa e pergunte por seu patrão.”
Quando o empregado voltou para casa, descobriu que seu senhor havia morrido durante sua ausência. Algumas horas depois que o criado havia saído, o corpo do patrão começou a inchar, até que finalmente faleceu.”
Leituras recomendadas
O Amor é o Vinho (em espanhol) – Sheikh Muzzafer Ozak Al-Jerrahi
Na cultura ocidental moderna, foi o pai da psicanálise, Sigmund Freud, quem iniciou o estudo dos sonhos, vinculando-os a complexos, medos e principalmente à sexualidade. Já seu discípulo e quase antagonista, Carl Gustav Jung, percebia os sonhos como um mundo mítico, mitológico e arquetípico, que poderia vir à tona trazendo conhecimentos ancestrais, anteriores à própria existência do sonhador. A esse fenômeno o psicanalista suíço dava o nome de ‘inconsciente coletivo’.
Na literatura e nas artes, o sonho ganhou destaque com o surrealismo, movimento deflagrado pelo poeta francês André Breton, em 1924. Até então, representações de sonhos e pesadelos podiam ser encontrados nas pinturas de Peter Brueghel, Hyeronimus Bosch e Goya ou em passagens eventuais da literatura. Com o surrealismo, porém, o sonho passa da condição de elemento casual na arte para tornar-se um método para a construção da própria obra.
Com base nas descobertas psicanalíticas, o surrealismo introduz o conceito de "automatismo psíquico" (fluxo ininterrupto da linguagem) para libertar o conteúdo onírico da alma, fundindo real e imaginário, para que o artista se expresse sem travas ou restrições, com seus claros e escuros. Os sonhos se tornam matéria-prima para a criação artística.
A partir de 1926, o surrealismo invade a arte. O cinema (com “Um cão andaluz”, de Luis Buñuel e Salvador Dali), a literatura, o teatro (“Assim que Passem Cinco Anos”, de Garcia Lorca), a poesia (Lorca, Aleixandre, Alberti, Octavio Paz, René Char, Breton, Neruda, Dylan Thomas, Murilo Mendes), a pintura (com Dali, Max Ernst, Magritte, Miró, Picasso, Wilfredo Lam, Ismael Nery), a escultura, mesmo a comédia de televisão passam a receber influência –ainda que indireta e diluída- da linguagem onírica. Hoje, qualquer clipe de música traz imagens de cunho surrealista. A própria palavra tornou-se sinônimo de uma situação impossível, que ocorre abruptamente no cotidiano.
Um dos exemplos pitorescos dessa visão está numa anedota sobre o poeta surrealista francês Saint Paul Roux, que, ao deitar-se para dormir, pendurava do lado de fora da porta um cartaz onde estava escrito: “Poeta trabalhando”.
Os sonhos e as religiões
Se a arte só oficializou o sonho como protagonista da linguagem a partir do surrealismo, o mesmo não se pode dizer das religiões, onde sempre teve destaque. Para as religiões, o sonho representa a continuidade da vida do eu num universo sem matéria (o sono), para o qual se vai e vem diariamente.
Na interpretação psicanalítica os sonhos são o resultado de desejos e pulsões inconscientes. Mas, na visão espiritualista, o sonho representa a comunicação do mundo sutil com o homem. É através dele que se recebem presságios (como entre os gregos politeístas), profecias (como com o monoteísta José, no Egito, com a interpretação dos sonhos do faraó), revelações e intuições (como entre os índios hopi, animistas).
O sonho é a consciência desperta do eu dentro do mundo do sono (que os antigos poetas chamavam de “pequena morte”). Assim como no estado de vigília pode-se levar uma vida fragmentada ou mais consciente, também durante os sonhos pode-se ter mais ou menos clareza. Há diversos tipos de sonhos, desde aqueles que parecem não ter sentido algum para a pessoa, até aqueles que são nítidos e que trazem, após o despertar, uma mensagem específica ou a sensação de experiência vivida.
Os sonhos e seu conteúdo variam com a qualidade da vida interior que o indivíduo (o “sonhador”) leva em seu dia a dia. Pessoas que vivem apenas para seus afazeres e interesses materiais, sem um olhar transcendente, em geral têm sonhos dispersos, desconexos, sem relação aparente com nada. Estes quase sempre são esquecidos, tão logo se desperte. Às vezes, sequer há a lembrança de se haver sonhado.
Há sonhos pesados, terríveis –chamados pesadelos- que podem tanto ser o efeito do desgaste corporal e psíquico sobre o eu, como podem simbolizar medos internos e ocultos. Mas podem, também, ser o meio pelo qual o eu profundo procura comunicar algo de relevante à pessoa, na forma de imagens e sensações que causam transtorno.
Porém, para quem reconhece interiormente a existência de uma realidade espiritual, e que pauta sua vida não apenas em satisfazer suas necessidades materiais, mas em servir ao semelhante, com plena consciência de que a morte pode chegar a qualquer momento, o mundo dos sonhos não é mais um mundo sem sentido ou com sentido oculto. Ele se torna uma porta para um plano maior, onde o eu é ensinado e preparado, recebendo orientações de cunho moral, material, psicológico e espiritual.
O grande mestre e sheikh sufi (muçulmano) Muzaffer Ozaki, da ordem Halveti Jerrahi, dizia que (...) “ao dormir, a alma abandona o corpo, mas sem perder sua conexão com ele, como a luz que sai de uma lanterna. Essa luz se estende até a tela divina, onde ficam registradas as anotações que lhe dizem respeito. Ao despertar, a luz da alma volta ao corpo, como quando se desliga uma lanterna. Por meio da extensão da alma, o sonhador pode perceber um nível de conhecimento que se encontra além de seu domínio, no âmbito do divino.”
“(...) Os símbolos e imagens dos sonhos são como hieróglifos que podem ser lidos por pessoas experientes. Mas estes símbolos mudam de situação para situação, de pessoa para pessoa, de alma para alma. (...)
Nunca se deveria contar os sonhos a alguém que tem o hábito de falar mal dos outros. Eles só devem ser contados para aquelas pessoas cujas bocas estão limpas.”
Uma narrativa do sheikh Muzzafer Ozak
“Um dervixe que vivia no campo, longe da cidade onde seu mestre morava, teve um sonho. Sentia que era um sonho importante e que devia contá-lo a seu mestre imediatamente. Ele sonhara que seu corpo inchava como se fosse uma mulher grávida. Então, saía uma serpente de sua barriga e seu corpo voltava ao tamanho normal.
Como estava muito ocupado para visitar seu mestre, o dervixe chamou um de seus empregados de confiança. Contou-lhe o sonho e mandou-o para a cidade, para que procurasse e contasse ao seu mestre. O criado foi orientado para que não contasse o sonho a mais ninguém, e que até mesmo evitasse pensar nele. O dervixe sabia que era muito importante revelar seus sonhos apenas àquela pessoa que pudesse interpretá-lo.
O empregado partiu imediatamente à cidade. Pelo caminho, encontrou um conhecido que tinha fama de linguarudo. Este homem lhe perguntou o que estava fazendo ali e o criado respondeu que ia até a cidade. “O que você vai fazer por lá?”, perguntou o linguarudo.
O empregado respondeu: “Tenho que levar uma mensagem da parte de meu senhor.”
“Que mensagem?”
“É confidencial.”
O homem continuou pressionando o empregado para que desse mais detalhes até que, finalmente, este contou que estava indo ver o mestre de seu amo, para contar-lhe o sonho que havia tido na noite anterior
O linguarudo começou, então, a perguntar-lhe de que se tratava o sonho. No começo, o empregado se negou a contar, mas finalmente acabou por ceder. “Meu amo sonhou que inchava”.
Sem esperar o fim da narrativa, o linguarudo começou a rir e disse: “Então ele estourou, como um balão furado por uma agulha”. Tão logo satisfez sua curiosidade, foi embora.
O criado apressou-se a chegar á cidade, indo diretamente à casa do mestre. Quando foi recebido, disse: “Meu senhor teve um sonho na noite passada e roga que o senhor o interprete. Ele sonhou que seu corpo inchava...”
“Páre!”, disse de repente o mestre. “O sonho já foi interpretado. Não há mais nada que eu possa fazer. Volte para sua casa e pergunte por seu patrão.”
Quando o empregado voltou para casa, descobriu que seu senhor havia morrido durante sua ausência. Algumas horas depois que o criado havia saído, o corpo do patrão começou a inchar, até que finalmente faleceu.”
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Primeiro Manifesto Surrealista - André Breton
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